Não foi só o céu que amanheceu azul neste domingo (03) em Niterói. A "Caminhada de Conscientização do Autismo" levou centenas pessoas vestidas de azul à orla da Zona Sul com objetivo de reivindicar a inclusão social de pessoas com a deficiência. O evento, que contou com familiares, profissionais e apoiadores, teve início às 10h no Museu de Arte Contemporânea (MAC) e seguiu até o final da Avenida Jornalista Alberto Francisco Torres, passando pela Praia de Icaraí.
Pai de uma criança autista, o cirurgião dentista José Muniz, morador de Niterói, estava contente por poder participar do evento. Segundo ele, a caminhada pode ser considerada histórica para luta pelos direitos da pessoa com autismo na cidade. “Um por cento da população do mundo é de autistas, isso equivale a 2 milhões de brasileiros, que hoje não conseguem ter acesso ao serviço público de saúde e vivem sem um tratamento adequado”, destaca o cirurgião dentista.
Realizada em Niterói pela primeira vez, a data da caminhada foi escolhida em função da semana do Dia Mundial da Conscientização do Autismo, 2 de abril, criado pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2007.
O evento é organizado pelo terceiro ano pelo grupo “Movimento Família Azul”, que reúne responsáveis, profissionais de saúde, de educação e apoiadores, das cidades de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí.
Acompanhada do filho autista Felipe Abreu, de 20 anos, a professora Cristiana Abreu, de 24, falou da importância do país avançar na garantia dos direitos da pessoa com a deficiência. “Meu filho está terminando ensino médio e eu não sei o que fazer, pois a faculdade não o aceita e não tem cursos profissionalizantes adaptados. A formação e a profissionalização também precisam estar em pauta para os autistas”, reivindicou Cristiana.
Autor de leis municipais que buscam garantir direitos de pessoas com autismo, o vereador de São Gonçalo, Diego São Paio (Rede Sustentabilidade), afirma que a região hoje serve como exemplo para outros municípios, e até outros países, no que diz respeito a ações e políticas públicas para o autista. “Somos espelhos para o Brasil e por isso temos transmitido cada vez mais nosso conhecimento e experiencias à outras cidades. O grupo Família Azul é formado por famílias e profissionais que atuam com pessoas autistas da região, mas a caminhada sempre acaba recebendo gente de todo Estado”, afirma o vereador.
O Transtorno do Espectro Autista é uma disfunção no desenvolvimento que afeta a capacidade de comunicação, de socialização, comportamento e, em muitos casos, a linguagem. Para um melhor tratamento o diagnóstico deve ser feito antes dos dois anos de idade.
Em São Gonçalo a defesa dos diretos de pessoas autistas ganhou força quando a professora Mila Figueira, de 47 anos, e a funcionária pública Barbara Parente, de 42, somaram seus esforços como mãe de crianças autistas na luta pela igualdade de direitos. Ainda na comemoração da recente aprovação de uma lei que determina um levantamento das pessoas autistas na cidade, elas afirmam que a luta ainda precisa avançar mais no município. “Sempre reclamei muito que São Gonçalo não tinha nada voltado aos autistas até que me apresentaram a Bárbara e juntas nós procuramos apoio no poder público. A partir das nossas reivindicações, que foram ganhando apoio, foi sendo criados projetos e leis específicas na cidade”, explica Mila, que também faz parte da Comissão de Defesa dos Diretos da Pessoa com Deficiência da OAB do Rio de Janeiro.
A lei para realização do censo representa um grande avanço, segundo Parente. “A gente vai poder quantificar a dimensão do autismo na cidade permitindo que o poder público possa atuar de maneira mais eficaz. Nossa luta agora é por uma clínica especializada, que já tem inclusive um espaço reservado”, ressalta a funcionária pública. Avanços e cuidados - A empresária e moradora de Itaboraí Berenice Piana, uma das fundadoras do grupo Família Azul, é também uma das autoras da Lei Federal 12.764 de 2012, que leva seu nome e que inseriu o autismo entre as deficiências físicas, garantindo acesso ao diagnóstico, ao tratamento, à educação e à cidadania. Além disso, a cidade de Berenice também foi a primeira do país a implantar uma clínica-escola pública especializada em autismo. “A lei vem trazer o reconhecimento de que o autista é uma pessoa com deficiência, definir o que é autismo e garantir o atendimento multidisciplinar que ele necessita, incluindo a inclusão na rede pública de ensino com acompanhante especializado, que é muito importante”, explica Berenice.
Segundo Piana as dúvidas quanto ao autismo e falta de diagnóstico precoce no Brasil acontecem em razão das universidades não capacitarem os profissionais para a questão. Assim, segundo ela, muitas crianças chegam aos 10 anos de idade sem diagnóstico. “Profissionais saem das faculdades incapacitados para trabalharem com autismo. Isso ainda é um grande problema. Mas não é difícil diagnosticar, é preciso apenas capacitação. Ao mesmo tempo, pais e responsáveis precisam estar atento à crianças que não olham nos olhos, apresentam a fala repetitiva, sem noção do que estão dizendo, que não socializam com os colegas ou não usam os brinquedos de forma adequada. Essas são características essenciais para perceber se uma criança tem autismo. Além disso, se a partir dos oito meses a criança não olha quando é chamada pelo nome também precisa ser acompanhada com mais cuidado, pois isso é um forte indicador de autismo”, alerta Berenice.
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